Nos últimos anos, os incentivos fiscais que mantém a Zona Franca de Manaus passaram a ser alvo de uma série de decretos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Os textos traziam insegurança jurídica para a fabricação de uma série de componentes, levando muitas empresas a suspenderem operação ou até mesmo deixarem o polo industrial. Com a mudança de governo, esperava-se um tempo de maior tranquilidade na região, mas não é bem assim.
De acordo com a avaliação de Eduardo Bonates é advogado especialista em Contencioso Tributário e Zona Franca de Manaus, a Advocacia-Geral da União (AGU) está em modo de ataque e as teses tributárias em tramitação nos tribunais superiores a respeito do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e podem comprometer o futuro do modelo econômico.
Para o advogado, esses impostos se tornaram a bola da vez nas disputas bilionárias que o Governo Federal trava na Justiça. Os processos tributários sobre a PIS e a Cofins em tramitação no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF) possuem um impacto estimado de R$ 635,4 bilhões.
Ao menos 11 teses diferentes serão avaliadas pelos ministros, atendendo a pedidos da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já afirmou em diversas entrevistas que essas batalhas no STJ e no STF servirão para ampliar a receita do governo, para viabilizar as metas contidas na proposta do novo arcabouço fiscal (NAF), aprovado esta semana.
“Os ministros dos tribunais superiores têm acatado esses pedidos da Advocacia-Geral da União, muitas vezes por meio de decisões extremamente controversas. Nem mesmo os princípios constitucionais tributários têm sido respeitados, levando os juristas e tributaristas a acreditar que a sanha arrecadatória do Governo Federal tem se sobreposto ao sistema de proteção legal dos contribuintes”, lembrou o jurista.
Segundo Bonates, o maior problema atualmente é o discurso dúbio do governo, defendendo a Zona Franca por um lado, permitindo ações dessa natureza da AGU de outro. “Das 3 figuras mais importantes do Governo Federal na seara econômica, duas (a Ministra do Planejamento e o Secretário da Reforma Tributária) já tiveram duras críticas aos benefícios fiscais do Modelo. A terceira figura, o Ministro da Fazenda, já afirmou que um fundo internacional supriria as perdas da Zona Franca de Manaus. Ou seja, mais do que dúbio, o discurso é aterrorizante. Para piorar, o presidente não se pronuncia”, alertou.
Teoricamente, a Constituição protege a Zona Franca de Manaus, mas há maneiras de burlar essa proteção. “É possível destruir a Zona Franca de Manaus sem alterar nenhum artigo legal. Basta retirar a competitividade do Modelo (por exemplo, fazendo alterações de alíquota do IPI e do Imposto de Importação, como acabou de fazer Geraldo Alckmin) que ele não se sustenta” afirma.
De acordo com o advogado, os próximos alvos da União devem ser as decisões judiciais que suspenderam a exigência dos dois tributos em razão das receitas obtidas na área de incentivos, principalmente na Zona Franca de Manaus. Quatro das teses sobre PIS/Cofins que estão nos tribunais superiores beneficiam as empresas instaladas no Polo Industrial de Manaus e nas Áreas de Livre Comércio da Amazônia Ocidental.
O temor aumentou com as recentes decisões do STF e do STJ, que modificam a coisa julgada em matéria tributária e permitiram até mesmo a cobrança de valores retroativos em processos transitados em julgado. “As recentes decisões judiciais e sua natureza eminentemente política geram extrema preocupação no meio empresarial, sendo a insegurança jurídica uma realidade crescente das empresas instaladas na Zona Franca de Manaus. Nem mesmo processos encerrados há anos estão hoje a salvo”, assusta-se.