Opinião

Pensando pragmaticamente, candidatura de Moro é ótima para a esquerda

Embora moralmente execrável, a candidatura de Sérgio Moro fragmenta a extrema-direita, cria um inimigo íntimo para o presidente Bolsonaro e tem contra si derrotas históricas no STF e a Vaza Jato. Prato cheio para a esquerda (se ela souber aproveitar)

O ex-juiz e ministro da Justiça Sérgio Moro anunciou nesta segunda-feira (01/11/21) a escolha do Podemos como partido para se filiar buscando a disputa das eleições presidenciais em 2022. Embora moralmente reprovável, a candidatura do magistrado protagonista da extinta Operação Lava Jato, pode ser benéfica para a esquerda. Vamos entender os motivos.

Fragmentação na extrema-direita

Hoje a disputa está literalmente polarizada e o segundo turno das eleições presidenciais de 2022 seria disputado pelo atual presidente Jair Bolsonaro (Sem Partido) e o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT). Do ponto de vista ético, qualquer pessoa que tenha mínimo compromisso com a democracia sabe que os dois candidatos não são comparáveis, como já foi explicado aqui. No entanto, para uma parte da sociedade, empresários e imprensa existe uma necessidade urgente de uma “terceira via”.

A tão proclamada terceira via, na verdade, é uma falácia. Existem várias vias, de diferentes campos políticos que sempre disputam a eleição: Ciro Gomes, João Dória, Guilherme Boulos, etc. O que esse grupo deseja, na verdade, é uma via que junte sua visão político-econômica com viablilidade pra vencer uma eleição de dois atores com forte militância. E Sério Moro se encaixa perfeitamente nesse perfil, mas se o intuito é prejudicar uma candidatura de Lula, pode ser um tiro no pé.

Moro tem telhado de vidro

Embora seja tratado como terceira via, não há dúvidas que Moro habita o mesmo terreno político da extrema-direita de Bolsonaro, até por ter sido crucial para sua eleição e participado do seu governo. E vai disputar com o atual presidente tanto seus próprios eleitores quanto a faixa mais ao centro, em especial os indecisos que não desejam os dois primeiros colocados atualmente.

Mas, como não tem experiência política para penetrar em camadas mais populares do país e certamente terá sérios problemas para conseguir palanques com partidos que tiveram imbróglios com a Lava Jato, restará ao ex-juiz dialogar com a extrema-direita de Bolsonaro mesmo. Ou seja, o mais provável é que ambos se enfraqueçam mutuamente.

Além disso, embora pareça que Moro tem um arsenal de elementos que possa usar tanto contra Bolsonaro (por ter sido seu ministro e saído após uma acusação investigada até hoje) quanto contra o ex-presidente Lula, pelas duas condenações enquanto atuava pela Lava Jato, a realidade é outra.

A bem da verdade, a acusação de interferência de Bolsonaro na Polícia Federal segue sem conclusão, e Lula tem a seu favor toda o escândalo da Vaza Jato para se defender, além, é claro, dos julgamentos no Supremo Tribunal Federal (STF) que confirmaram a suspeição do magistrado. Por mais apelo ao antipetismo e acusações da Força-Tarefa de Curitiba que se faça, a suspeição e a simbiose de Moro com o catastrófico governo Bolsonaro serão inevitáveis.

Assim, por mais rancor e revolta que a canditatura de Sérgio Moro possa despertar na esquerda, em especial nos petistas, ela é extremamente útil, principalmente após Bolsonaro ter aprendido a sua mais eficiente arma desde que começou a governar: calar a boca. Desde que foi enquadrado por ministros do STF, o presidente parou de incendiar a política nacional e, surpreendentemente, começou a diminuir a distância para Lula nas pesquisas de intenção de voto. Alguém que possa atrapalhar sua caminhada é mais do que bem vindo.

Relembrando

Sergio Fernando Moro ganhou notoriedade ao ser o juiz responsável pelos processos da Lava Jato. À frente da 13ª Vara Federal de Curitiba, a Força Tarefa atuou contra crimes de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e pagamentos de propinas envolvendo grandes nomes da política e do empresariado brasileiro. Algumas inclusive do próprio Podemos, que até 2017 se chamada Partido Trabalhista Nacional (PTN).

Mas seu maior “feito” foi condenar o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva por crimes de corrupção passiva nos casos do triplex do Guarujá (SP), com pena de 8 anos e 10 meses de prisão, e do sítio em Atibaia, na qual o ex-presidente recebeu pena de 17 anos de prisão. Com essas condenações, Lula ficou impedido de disputar as eleições de 2018, abrindo caminho para o candidato Jair Bolsonaro, que depois nomeou o próprio Moro como Ministro da Justiça.

Em abril de 2020, pediu demissão ao ser informado pelo presidente Jair Bolsonaro que trocaria o comando da Polícia Federal. Em seu pronunciamento, Sergio Moro disse que “não poderia aceitar a substituição”, que foi considerada como interferência presidencial na hierarquia do ministério comandado pelo ex-juiz.

Mais tarde, após uma série de reportagens do site Intercept Brasil intitulado Vaza Jato, foi descoberto que Moro agiu em conluio com procuradores da Lava Jato em Curitiba, fato que foi levado ao Supremo Tribunal Federal, que em julho de 2021 reconheceu a parcialidade do juiz no processo.

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