A pandemia da Covid-19 teve efeitos devastadores em Manaus. Além de três quatro ondas da doença, que causou tragédias como o enterro de vítimas em covas coletivas e as mortes pelo colapso no fornecimento de oxigênio, as consequências sociais também foram igualmente profundas. Relatório divulgado pelas Aldeias Infantis SOS em dezembro mostram que os jovens de mais baixa renda foram os que mais sofreram.
Segundo dados do Ministério da Cidadania, a partir de dados coletados pelo Sistema Único de Assistência Social em 2022 mostra que uma em cada cinco pessoas da capital amazonense vive em situação de extrema pobreza. Segundo o cientista social José Carlos Sturza de Moraes, coordenador do Instituto Bem Cuidar e supervisor da pesquisa, em junho de 2022, Manaus contava com mais de 160 mil famílias vivendo em situação de extrema pobreza, correspondendo a cerca de 445 mil pessoas nesta situação (19,7% de sua população).
“Em resumo, a proporção é de uma a cada cinco pessoas vivendo em situação de miséria na capital do Amazonas. Além disso, a falta de oferta adequada de escolas de educação infantil tem feito com que adolescentes e jovens e, muito provavelmente, crianças estejam cuidando de outras crianças na cidade, com todos os riscos envolvidos e comprometimento dos estudos desses estudantes”, alerta Moraes.
Estudantes que moram com a mãe somam 77%, com irmãos e/ou irmãs 62% e 52% residem com o pai. Em 9% dos casos, adolescentes/jovens vivem apenas com a mãe ou com a mãe e irmão/s e/ou irmã/s. Desse total, onze por cento relataram que alguém com quem moravam faleceu devido à Covid-19 (47 casos).
Antes da pandemia, 22% desses estudantes já haviam experimentado falta de comida em casa e durante a pandemia esse percentual subiu para 29%. Passaram a residir com outras pessoas
durante a pandemia 12% (destes/as, 14 estudantes por infecção por Covid-19 da pessoa cuidadora ou de outro familiar); em dois casos, por morte da pessoa cuidadora.
Cerca de 40% afirmam que cuidam ou que ajudam a cuidar de outra pessoa, mesmo entre adolescentes de 12 a 14 anos. Entre jovens e adolescentes pretos e pardos, a proporção de quem afirma cuidar ou ajudar a cuidar de alguém é maior (42%), em comparação com autodeclarados de cor branca (31%). Foram justamente os estudantes cuidadores (68%) que declararam ter enfrentado dificuldades para acompanhar as aulas remotas durante a pandemia, em comparação aos estudantes não cuidadores (61%).
Cerca de 22,4% dos casos, alguém que morava com o jovem perdeu o emprego durante a pandemia. Em 43% das famílias houve diminuição da renda durante a pandemia. A redução do salário (em 39%), bem como a demissão de alguém da família no período (em 30%) foram os principais motivos da diminuição da renda familiar.
Estudantes autodeclarados de cor preta e parda constituem a maior proporção entre os que relatam ter havido perda de emprego por pessoa corresidente durante a pandemia, se comparados a estudantes autodeclarados de cor branca. Da mesma forma – e como consequência -, é maior a proporção de adolescentes e jovens autodeclarados de cor preta e parda cuja renda familiar diminuiu no período da pandemia.
O relatório
O Relatório Diagnóstico quanto à Promoção, Proteção e Defesa do Direito da Criança e do Adolescente à Convivência Familiar e Comunitária em Manaus traz informações importantes acerca de condições de vida, acesso a direitos fundamentais e violações de direitos, especialmente de grupos em maior situação de vulnerabilidade socioeconômica na capital amazônica. O diagnóstico é resultado da pesquisa, promovida pelo Instituto Bem Cuidar (IBC), divisão de pesquisa e produção de conhecimentos da Aldeias Infantis SOS, concluída em julho de 2022.
O relatório também traz 12 recomendações para os poderes públicos, conselhos e sociedade da capital amazonense, que abordam desde a necessidade de manutenção dos auxílios públicos às famílias em situação de fragilidade socioeconômica até a necessidade de ampliar serviços públicos, como escolas infantis e serviços de apoio às famílias, como os CREAS.