Contexto

Indústria de alimentos desperdiça 30% de tudo que produz

A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) instituiu 16 de outubro como o Dia Mundial da Alimentação, no intuito de promover uma reflexão mundial sobre o assunto. A falta de acesso regular a uma alimentação adequada por grande parte da população brasileira tem sido um dos principais desafios enfrentados pela sociedade ao longo dos últimos anos.

O país havia saído do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2014, por meio de estratégias de segurança alimentar e nutricional aplicadas desde meados da década de 1990. Mas voltou a figurar no cenário a partir de 2015, obtendo um especial agravamento ao longo da pandemia de Covid-19 que afetou o mundo todo por dois anos a partir de 2020.

Em 2022, o Segundo Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia de Covid-19 no Brasil apontou que 33,1 milhões de pessoas não têm o que comer — o que representa 14 milhões de novos brasileiros em situação de fome. Conforme o estudo, mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com a insegurança alimentar em algum grau: leve, moderado ou grave.

Os dados do Segundo Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar, divulgados em junho, foram coletados entre novembro de 2021 e abril de 2022, por meio de entrevistas em 12.745 domicílios em áreas urbanas e rurais de 577 municípios distribuídos nos 26 estados e no Distrito Federal. Pesquisa anterior, de 2020, mostrava que a fome no Brasil tinha voltado para patamares equivalentes aos de 2004. A piora no cenário econômico, o acirramento das desigualdades sociais e o segundo ano da epidemia do coronavírus agravaram a situação.

Enquanto organismos internacionais e nacionais tentam estimular passos à frente na luta contra o deficit nutricional, o Brasil recua. Numa análise do consultor legislativo do Senado Henrique Salles Pinto, o panorama da fome no Brasil mostra que o país regrediu a um patamar equivalente ao da década de 1990. De acordo com o especialista, mesmo o fato de sermos o segundo maior exportador de alimentos do mundo no ranking da Organização Mundial do Comércio (OMC) não tem sido suficiente para erradicar o problema no território nacional. Henrique acredita que essa situação poderia ser mudada se não houvesse tanto desperdício de alimentos no país.

Tem comida pra todo mundo?

A fome não é um problema exclusivo do Brasil e nem desta geração. Isso porque não basta matar a fome de quem não tem o que comer hoje. A população só faz crescer e promete inflar as cadeias de produção e consumo, o que também irá impactar no percentual de pessoas sem acesso a comida. Ou seja, a fome vai aumentar, progressivamente. Hoje, no mundo são 7,8 bilhões de pessoas que precisam se alimentar mas, em 2050, serão 9 bilhões. Tem comida no mundo para toda essa gente?

“De fato, em todo o território nacional, 39 mil toneladas de comida em condições de serem aproveitadas vão para o lixo diariamente em mercados, feiras, fábricas, restaurantes, quitandas, açougues e fazendas. O número leva em conta dados de vários setores: agricultura, indústria, varejo e serviços. São vários alimentos como iogurtes perto do vencimento, tomates manchados, pães “amanhecidos”, carne esquecida no congelador e milhares de itens que, por diversas razões, acabam descartados. Tamanha quantidade é suficiente para prover três refeições diárias a, aproximadamente, 19 milhões de pessoas”, dimensiona Henrique Salles.

“No Brasil, por exemplo, 20% da água é desperdiçada nos encanamentos. Outro problema é a quantidade de terras degradadas, abandonadas, sofrendo erosão e que não são aproveitadas nem como reserva alimentar, nem como espaço para produção alimentar. A reciclagem e a economia circular que permite que todos os resíduos voltem a condição de matéria-prima ou sejam reaproveitados, como adubo por exemplo, já estão sendo aplicados em muitas comunidades. E o Banco de Alimentos, uma ideia genial e que funciona plenamente, recebe doações e distribui para quem tem fome”, finaliza Sérgio Lopes, criador do portal ECONOSCO, um “hub” de informação, interação e engajamento das questões da sustentabilidade a partir de projetos audiovisuais.

Aumento de estoques

Um tema que apresenta relação direta com o combate ao desperdício de alimentos diz respeito às estratégias de estoques de produção. Para Henrique Salles, o estímulo ao armazenamento poderia ser alcançado complementando-se a lei que instituiu o Alimenta Brasil. Isso porque, segundo ele, uma alteração no artigo 39 da Lei 14.284/2021 permitiria à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), no âmbito das operações do Programa Alimenta Brasil, continuar articulando-se junto a cooperativas e demais organizações formais da agricultura familiar, inclusive com a apresentação de metas de ampliação de seus estoques públicos para o alcance dos objetivos do Alimenta Brasil, nos termos de regulamento. A modificação da lei, no entanto, cabe a senadores e deputados.

Outro assunto frequente nos debates do Congresso, conforme o consultor, refere-se a medidas financeiras para agricultores (principalmente familiares) aumentarem sua produção e destinarem essa produção a pessoas de baixa renda. Ele citou como referências a Lei 11.326/2006, que estabelece as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais, e a Lei 14.284/2021, que concede auxílio financeiro aos agricultores familiares brasileiros, de modo a auxiliá-los em suas atividades produtivas.

“Garantir recursos suficientes no Orçamento da União para o referido programa ao longo dos próximos anos deve ser uma das prioridades dos parlamentares brasileiros. Nesse mesmo sentido, a garantia de, no mínimo, R$ 600 mensais às famílias inscritas no Auxílio Brasil é fundamental para reduzir os índices de insegurança alimentar e nutricional no país, lembrando que esse valor está previsto apenas até dezembro de 2022”, alerta o consultor do Senado.

Com informações da Agência Senado

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