O presidente Jair Bolsonaro discursou nesta segunda-feira (21/09/21) na abertura da sessão de debates da 76ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, nos Estados Unidos. O balanço geral da sua constrangedora passagem pela cúpula é de uma série de gafes e mentiras cometidas tanto pelo presidente quanto por membros da sua comitiva.
Mentiras
Em seu discurso, Jair Bolsonaro mentiu pelo menos em temas como Amazônia, pandemia e corrupção. O discurso na íntegra pode ser conferido aqui. O Vocativo listou cada uma delas abaixo:
- 1) “Estamos há 2 anos e 8 meses sem qualquer caso concreto de corrupção” – Por que não é verdade? Fora uma série de denúncias envolvendo ministros, aliados do governo ou aspectos pessoais do presidente, como o caso das Rachadinhas, existem dois escândalos envolvendo diretamente sua administração: o do chamado Orçamento Secreto e o caso da compra da vacina Covaxin.
- 2) Isso é muito, é uma sólida base, se levarmos em conta que estávamos à beira do socialismo – Por que não é verdade? Em 14 anos de governos do PT, não foi feita qualquer alteração na Constituição Federal que alterassem o modelo econômico do país. E foi no governo do antecessor de Bolsonaro, Michel Temer, que foram implementadas reformas de cunho liberal, como a trabalhista.
3) Nossas estatais davam prejuízos de bilhões de dólares, hoje são lucrativas – Por que não é verdade? Segundo dados do Tribunal de Contas da União, entre 2002 e 2013, o lucro das estatais passou de U$ 6,4 bilhões para 52,2 bilhões.
4) Nosso Banco de Desenvolvimento era usado para financiar obras em países comunistas, sem garantias – Por que não é verdade? Em seu site, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já desmentiu essa alegação.
5) Apresento agora um novo Brasil com sua credibilidade já recuperada – Por que não é verdade? As negociações do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia (UE) se encontram paralisadas. A culpa, segundo deputados do parlamento europeu, é da política ambiental do governo do presidente Jair Bolsonaro.
6) “Como reflexo, menor consumo de combustíveis fósseis e redução do custo Brasil” – Por que não é verdade? Estudo lançado pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) em 2020 estimou que os subsídios aos combustíveis fósseis no Brasil, na forma de renúncias fiscais e gastos diretos, alcançaram R$ 342,36 bilhões. A média anual de subsídios foi da ordem de R$ 68,6 bilhões, ou seja, 1% do Produto Interno Bruto (PIB) do país ou o equivalente a mais de dois programas Bolsa Família.
7) “Temos tudo o que investidor procura: um grande mercado consumidor, excelentes ativos, tradição de respeito a contratos e confiança no nosso governo” – Por que não é verdade? Segundo relatório da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), ligada às Nações Unidas, os investimentos estrangeiros no Brasil em 2020 atingiram o pior patamar dos últimos 12 anos, tendo registrado valores inferiores aos da crise financeira internacional, em 2008. Em valores absolutos, a porcentagem representa uma queda aproximada de US$ 24 bilhões nos investimentos externos.
8) “Os recursos humanos e financeiros, destinados ao fortalecimento dos órgãos ambientais, foram dobrados, com vistas a zerar o desmatamento ilegal” – Por que não é verdade? Em carta divulgada em abril deste ano, mais de 600 servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) afirmam que “todo o processo de fiscalização e apuração de infrações ambientais encontra-se comprometido e paralisado”.
9) “Na Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano anterior” – Por que não é verdade? Se houve queda em agosto, é porque o desmatamento registrado em junho na Amazônia cresceu pelo terceiro ano consecutivo: foram 1.062 quilômetros quadrados num único mês, observados pelo sistema Deter, versus 1.043 km2 em junho de 2020 e 935 km2 em 2019. Houve uma queda em relação a maio desse ano, que apresentou um pico de 1.391 km2; contudo, confirma o primeiro semestre com mais derrubada desde 2016, com 3.610 km2, ou 17% a mais do que o mesmo período de 2020.
Em webconferência realizada pelo Tribunal de Contas do Amazonas (TCE-AM) em julho de 2020, o presidente do comitê científico do International Geosphere Biosphere Progamme, Carlos Nobre, afirmou que o desmatamento da Amazônia alcançou níveis irreversíveis.
10) “As medidas de isolamento e lockdown deixaram um legado de inflação, em especial, nos gêneros alimentícios no mundo todo” – Por que não é verdade? O fechamento usado por estados e municípios para tentar conter o avanço do novo coronavírus pouco ou nada tem a ver com o aumento dos preços dos alimentos, como o Vocativo explicou aqui.
11) “Concedemos um auxílio emergencial de US$ 800 para 68 milhões de pessoas em 2020” – Por que não é verdade? Quem criou o Auxílio Emergencial foi a Câmara dos Deputados. E o valor jamais foi de U$ 800, 00 (o que daria algo perto de R$ 4 mil). Inicialmente, na primeira versão do relatório, o valor era de R$ 500,00 (contra os R$ 200,00 propostos pelo governo).
País fictício
Em nota, a Anistia Internacional afirma que país descrito por Bolsonaro não existe. “No entanto, essa imagem nega o que fatos e dados revelam: o país atravessa um período estendido de instabilidade e crises política, econômica, sanitária e de direitos humanos. A Anistia Internacional Brasil afirma que o Brasil apresentado por Jair Bolsonaro não existe. Há graves ameaças aos direitos humanos e violações de direitos de povos indígenas, dos cerca de 19 milhões de brasileiros que passam fome neste momento no país e das famílias das quase 600 mil vidas perdidas para a Covid-19”, afirma a entidade.
Momentos constrangedores
A visita de Bolsonaro, aliás, foi marcada por gafes e constrangimentos. Logo na chegada, no domingo (19/09/21), Bolsonaro, acompanhado por ministros e autoridades, foi fotografado comendo pizza de pé aparentemente em área externa de um restaurante. Isso porque em Nova Yorl só é permitida entrada em restaurantes pessoas vacinadas contra a Covid-19, algo que o presidente se recusa a fazer.
Na segunda-feira (20/09/21) foi a vez do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, protagonizar uma cena constrangedora. Diante de protestos contra o presidente realizado por brasileiros em Nova York, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, respondeu com um gesto obsceno. A atitude do ministro foi amplamente divulgada em vídeos nas redes sociais, que mostram o momento em que Queiroga aparece na janela de um micro-ônibus e ofende os manifestantes.