O novo ministro da Justiça, Sérgio Moro, pretende elaborar projetos de lei que visam alterar algumas condutas no sistema penal e prisional brasileiro. Uma das mais defendidas pelo ex-juiz federal é o modelo conhecido como “plea bargain”.
“Plea bargain não é somente uma delação premiada, mas sim um acordo oferecido pelo representante do Ministério Público ao réu, no qual o acusado confessa os fatos imputados e renuncia ao direito de ser levado a julgamento. Por isso, recebe a leniência de seus acusadores que, consequentemente, irão lhe aplicar uma pena reduzida em razão de ter evitado o processo criminal”, explica advogado Antonio Tovo, sócio de Souto Correa Advogados.
Caso o réu, por intermédio de sua defesa, não aceite a negociação do acordo porque se julga inocente das imputações, ele irá se declarar inocente (em termos jurídicos, “not guilty plea”) e irá a julgamento, momento em que, finalmente, serão analisadas as provas da acusação e da defesa e, ao final, o veredito do júri.
“Em julgamento, o réu poderá tanto ser absolvido quanto ser considerado culpado, hipótese em que será condenado a uma pena muito maior àquela que lhe foi oferecida no acordo inicial. Daí, a ideia de barganha”, afirma.
Vantagens e desvantagens
De acordo com Antônio Tovo, a vantagem estaria na celeridade porque o tempo do processo seria abreviado para um acordo pré-processual que evitaria o julgamento, tendo em vista que o réu assume a prática delitiva e, em razão da confissão, recebe uma pena reduzida. Estima-se que nos EUA 90% dos casos criminais são resolvidos em acordos.
“As desvantagens estão, justamente, nos problemas que essa ideia da barganha para fechar o acordo trouxeram para a realidade dos Estados Unidos: encarceramento em massa, coerção por parte dos procuradores para que os réus aceitem o acordo – mesmo sendo inocentes – e evitarem o resultado pior de uma condenação pelo júri e a questão racial”, pondera.
Em realidade, os EUA são hoje o país com a maior população carcerária do planeta – o que consiste em um sério problema econômico -, existem diversos precedentes de réus inocentes que aceitaram acordos por medo de ir a julgamento (detalhe: no sistema estadunidense, os procuradores podem apresentar a denúncia depois do réu decidir ir a julgamento, de modo a aumentar as imputações e, consequentemente, a quantidade de pena) e, por fim, o fato de os acusados negros receberem sentenças mais duras do que aquelas impostas aos brancos. Atualmente, 40% da população carcerária americana é composta de homens negros e 20% de homens hispânicos.
Meio jurídico
Nos EUA o plea bargaining não é uma unanimidade. Muito pelo contrário, há uma atuação muito forte da sociedade civil para desenvolver reformas no sistema de justiça criminal daquele país, sendo a questão dos acordos um dos principais pontos a ser reformulados.
“No Brasil, o meio acadêmico aponta para a necessidade de mais estudos sobre o tema, mas, desde que a ideia foi aventada por setores do Ministério Público e pelo Ministro da Justiça, pode se dizer que existe uma divisão nítida entre a percepção mais positiva em relação ao plea bargain por parte do Ministério Público e de alguns setores do Judiciário. Em contrapartida, a percepção de alguns juristas e da advocacia tem sido mais cética em relação à importação de um instituto jurídico que já é contestado em seu país de origem, justamente por dar poder de mais aos acusadores, gerando uma disparidade no processo penal”, afirma Tovo.
Uma das entidades que defende a adoção do modelo é a Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR). “A defesa pelo modelo “plea bargain” é luta histórica do Ministério Público Federal e da ANPR, que, em diversas oportunidades, esteve no Congresso Nacional defendendo propostas que traziam a ideia como uma das soluções para melhorar o sistema penal brasileiro”, afirmou a entidade em nota no seu site oficial.
Foto: EBC