Amazônia

Enem no Amazonas: desigualdade faz desempenho de alunos do interior ser pior

Pesquisadores da Fundação Getulio Vargas concluíram que o desempenho dos alunos no Enem reflete a realidade socioeconômica em que cada um deles vive. A pedido do Vocativo, eles analisaram seis cidades no Amazonas e o resultado é preocupante

Estudo realizado por pesquisadores da Fundação Getulio Vargas (FGV/EAESP) e publicado na última quarta-feira (17/11/21) na Revista de Administração Pública (RAP), mostra que uma parte significativa do desempenho dos alunos no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) reflete a realidade socioeconômica em que cada um deles vive. Aplicando a análise desse estudo ao Amazonas, fica mais nítido a distância entre os alunos da capital e do interior do estado.

O estudo foi feito a partir da análise e cruzamento de microdados do Enem 2018, do Censo Escolar 2018 e dados estatísticos do IBGE 2018, que geraram uma pontuação de desempenho. Os microdados do Enem contêm as notas dos mais de 4 milhões de alunos que realizaram o Enem naquele ano e as respostas deles ao questionário socioeconômico, enquanto os microdados do Censo Escolar 2018 trazem dados sobre a infraestrutura das escolas, disciplinas oferecidas, quantidade de salas, profissionais, entre outros.

O acesso a bolsas, renda familiar, raça, escolaridade e nível instrucional da mãe são relevantes para o desempenho escolar médio dos municípios e causam desigualdade na nota alcançada dos alunos, tanto para a prova objetiva quanto para a de redação. A pedido do Vocativo, os autores do estudo analisaram dados de seis cidades do Amazonas, incluindo a capital, Manaus.

Por ter melhor distribuição de renda e infraestrutura, Manaus acaba concentrando as melhores notas, puxadas justamente pelos fatores analisados no estudo da FGV. O maior acesso a posto de trabalho das mães, sozinho, é capaz de aumentar em mais de cinco pontos o desempenho dos alunos. Esse foi um dos poucos fatores que elevou a nota de alunos nas cidades de Humaitá, Coari, São Gabriel da Cachoeira e Tabatinga. De resto, os municípios do interior estiveram em desvantaem em todos.

“Nosso país é marcado historicamente por diversas desigualdades, dentre elas a econômica, a social e a de raça são as que foram mais determinantes no desempenho, segundo nosso estudo. O Enem reproduz essa lógica”, explica Anne Caroline de Freitas, doutoranda em ensino na USP e também autora do trabalho.

Redação

Outro problema constatado pelos pesquisadores foi a temática da redação. Isso porque muitas vezes as instituições escolares podem privilegiar uma cultura única, dominante economicamente e socialmente. Por muitas das vezes, os alunos que tem marcas étnicas, culturais e regionais específicas não conseguem acessar competências, habilidades e até mesmo a linguagem utilizada na escola.

“Chega na hora da prova, esses alunos têm um baixo desempenho, pois a prova não aborda e não valoriza suas referências culturais, linguísticas, religiosas. Esse aspecto fica evidente na prova da redação, a qual irá avaliar não só a habilidade de escrita mas também as relações cognitivas que esse sujeito é capaz de estabelecer”, afirma Anne.

Ainda segundo a pesquisadora, da maneira como está, a prova vai manter essa disputa desigual. E por esse motivo, precisa mudar. “Se o universo desse estudante está distante dessa cultura dominante, ele acaba tendo mais dificuldade em alcançar um bom desempenho. Por isso, devemos repensar o exame, torná-lo mais justo, mais inclusivo e também defender as ações afirmativas de acesso, como as cotas, e as ações de permanência estudantil”, sugere.

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