Uma das figuras mais influentes da política do Amazonas, o ex-governador Amazonino Armando Mendes morreu neste domingo em São Paulo, aos 83 anos. Desde então, começou um movimento de canonização nas redes sociais, meio político e imprensa locais enaltecendo os feitos do político, esquecendo os muitos problemas e momentos controversos da sua carreira.
É preciso descontar a comoção do momento, em que familiares e amigos (igualmente influentes) expressam sua admiração e carinho, fazendo com que os fatos positivos a seu respeito ganhem muito destaque. Isso precisa ser respeitado. Mas é preciso ir além da emoção e analisar o contexto político no qual Amazonino esteve inserido ao longo de sua vida. Sob pena de criarmos um mito, ao invés de uma figura histórica.
Pra começar, é importante lembrar que Amazonino não entrou para a política como uma liderança de movimentos sociais, mas por indicação de um governador biônico: seu grande mentor Gilberto Mestrinho. Mais do que isso: toda sua vida foi construída em cima da máquina pública, com a qual construiu uma imensa cadeia de apoiadores e sucessores que lhe deram suporte político. Isso precisa ser destacado: como político, na acepção da palavra, foi brilhante.
Mas uma sociedade é um reflexo dos seus governantes. Se nós podemos atribuir a um presidente a melhoria das condições de vida das pessoas que ele governa, então o inverso também precisa valer. Nesse caso, a carreira de Amazonino não pode se esse paraíso de feitos gloriosos descritos nos últimos dias.
Mesmo depois de quase cinco décadas de sua presença nos postos mais altos da política local (quatro vezes governador, três vezes prefeito, duas vezes senador) a situação do Estado é de completo abandono. Mais da metade da população do Amazonas se encontra em situação de pobreza ou extrema pobreza, além de insegurança alimentar e outras mazelas.
Nem é preciso lembrar que durante as duas primeiras ondas da pandemia da Covid-19, o estado não contava com uma única Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) no interior, o que contribuiu para o colapso no atendimentos nos hospitais, levando milhares de pessoas à morte.
Ora, uma das maiores atribuições dadas a Amazonino é a construção da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), o que é bem questionável, uma vez que salvo engano é para isso que políticos são pagos com dinheiro público. Pois bem, se ele deve ser lembrado e celebrado pelo que fez, então precisa ser responsabilizado pelo que não fez. Isso sem contar as acusações de crimes ambientais, improbidade administrativa e desvio de dinheiro público.
Não, Amazonino não é o único responsável pelos problemas do Amazonas, muito menos precisa ser diminuído na sua presença na histórica. O caso é a dimensão dada a ele e a mitificação da sua carreira. Tal qual outras figuras ao longo da história, ele deve ser retratado com o máximo de fidelidade, o que inclui seus pontos negativos. O problema aqui não é elogiar Amazonino. É só elogiar Amazonino, abrindo mão do debate político e senso crítico.