Dois anos se passaram desde a aprovação do Novo Marco Legal do Saneamento (Lei nº 14.026), em 15 de julho de 2020. A lei trouxe esperanças para o avanço do saneamento básico no país ao estabelecer novas diretrizes para o setor. Mas, dois anos depois, a realidade ainda está muito longe disso. É o que mostra o relatório “Avanços do Novo Marco Legal do Saneamento Básico no Brasil – 2022 (SNIS 2020)”, do Instituto Trata Brasil.
O levantamento aponta que o Brasil avança lentamente no sentido da universalização: a ausência de acesso à água tratada atinge quase 35 milhões de pessoas e 100 milhões de brasileiros não têm acesso à coleta de esgoto, refletindo em centenas de pessoas hospitalizadas por doenças de veiculação hídrica.
Os dados do SNIS 2020 apontam que o país ainda tem uma dificuldade com o tratamento do esgoto, do qual somente 50% do volume gerado é tratado – isto é, mais de 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento são despejadas na natureza diariamente.
Dos 3,9 mil municípios que deveriam apresentar a documentação da capacidade econômico-financeira, segundo Decreto 10.710/2021, que tinha como prazo 31 de dezembro de 2021, 1,1 mil municípios, quase um terço desse grupo, sequer apresentou a comprovação ou foi considerado irregular pelas respectivas agências reguladoras. 2,4 mil (cerca de 62%) estão em situação absolutamente regular e 325 foram considerados regulares, mas com alguma espécie de restrição.
Municípios com capacidade econômico-financeira comprovada são aqueles com melhores indicadores de atendimento de abastecimento de água e de esgotamento sanitário e chegam a investir R$ 50,39 a mais por habitante em relação aos municípios irregulares. Os municípios com contratos em situação irregular são justamente os que mais precisam despender recursos e investir em expansão de rede visando à universalização.
São quase 30 milhões de brasileiros nessas localidades e seus indicadores de atendimento de água e esgoto estão bem distantes da média nacional. A população com acesso à água nesses municípios teria que passar de 64,4% para 99% e a cobertura de esgoto teria que subir de 29,1% para 90% até 2033 para se alcançar a universalização prevista no Novo Marco Legal do Saneamento.
Desigualdade
Os municípios têm até 30 de novembro de 2022 para possuírem lei aprovada com regionalizações de saneamento básico, que podem ser estruturadas de três maneiras: Região Metropolitana, Unidade Regional de saneamento básico e Bloco de Referência. Três estados (Acre, Pará e Tocantins) sequer protocolaram Projeto de Lei (PL) junto ao seus respectivos legislativos, e outros três (Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais) ainda aguardam a tramitação desses PL junto às suas Assembleias Legislativas.
Enquanto 13,9% da população brasileira reside em municípios irregulares quanto a prestação dos serviços de saneamento de acordo com o Decreto 10.710/2021, este índice é superior a 60% em estados como Maranhão, Pará e Piauí, chegando a 100% dos municípios nos casos do Acre e de Roraima.
Investimento
O Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), no Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), encontrou uma necessidade de cerca de R$ 507 bilhões para se atingir a universalização até 2033, a preços de dezembro de 2020.
Estes valores não consideraram os investimentos realizados nos anos de 2019 e de 2020, que correspondem a aproximadamente R$ 19,9 bilhões e R$ 16,1 bilhões, respectivamente, a preços do mesmo período. Ao subtraírem-se estes investimentos do montante calculado no Plansab, restam ainda R$ 471 bilhões a serem investidos.
O investimento médio dos últimos cinco anos disponíveis no SNIS (2016-2020), a preços de dezembro de 2020, equivale a aproximadamente R$ 17,1 bilhões, o que significa que o investimento anual precisaria mais do que dobrar não somente em 2021, mas em todos os anos subsequentes para a universalização ser possível até 31 de dezembro de 2033, conforme previsto no Novo Marco Legal do Saneamento Básico.
“O estudo deixa claro que os investimentos no setor precisam evoluir consideravelmente para que se possa cumprir as metas estabelecidas no Novo Marco Legal do Saneamento. Dois anos após a aprovação do Marco, é possível avaliar uma mudança de cenário, principalmente com os investimentos garantidos por meio dos leilões, concessões e parcerias no setor. Entretanto, ainda é necessário a busca de soluções para municípios com contratos irregulares, cujos índices de saneamento são bastante precários. Investir em saneamento básico garante mais saúde e qualidade de vida para toda população” – Luana Siewert Pretto, Presidente Executiva do Instituto Trata Brasil.