Morar em Manaus sempre nos causou a sensação de isolamento, solidão. Sempre fomos uma cidade que reclamava de mais atenção do resto do país. Achávamos que nossas belezas naturais (nossos rios e florestas), nossos grande escritores e poetas (Márcio Souza, Thiago de Mello, etc.) e nossa culinária mereciam mais reconhecimento do resto do país. Bem, não há como negar que, de 2020 pra cá, Manaus ganhou muita atenção do resto do país e do mundo. Nós só tínhamos algo diferente em mente.
Chacinas em presídios, ataques de facções criminosas, epicentro da pandemia da Covid-19 no Brasil, enterros em covas coletivas e, é claro, a crise do oxigênio de janeiro de 2021. Mas de todas as formas terríveis que a cidade ficou conhecida no país e no mundo, Manaus conseguiu neste aniversário de 353 anos ser reconhecida por um feito ainda mais triste e desolador: a cidade mais bolsonaristas do país.
Ok, você pode argumentar que algumas cidades no Sul ou no Centro-Oeste chegam a dar mais de 70% de aprovação para o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), além de elegerem legislativo e executivo completamente alinhado ao chefe da República, mas nenhuma delas sofreu nas mãos dele como Manaus. É uma mistura de masoquismo com Síndrome de Estocolmo.
Nesses quatro anos, a cidade se viu diretamente prejudicada pelas ações e omissões tanto do presidente quanto dos seus aliados. Em alguns momentos, o governador Wilson Lima (União Brasil), por exemplo, preferiu a lealdade a Bolsonaro aos interesses da peça central da economia da cidade, a Zona Franca de Manaus. O mesmo vale para outros de seus apoiadores, como o candidato derrotado ao senado Coronel Menezes (Patriota).
O fato é que as eleições gerais deste ano mostraram que todas essas tragédias não serviram para criar um clima de indignação no povo da cidade. Pelo contrário. A sensação é de que nada disso aconteceu e a linha ideológica do presidente merece continuar, para completa perplexidade de boa parte do país. Mais de 65% dos habitantes de Manaus acha a gestão Bolsonaro/Lima digna de um segundo mandato.
Diante disso, não há o que comemorar. Manaus mostrou ser uma cidade cuja maioria dos seus cidadãos não sabe o que significa cidadania. Para a vergonha dos manauaras que mantiveram suas consciências. A verdade é que nós, a minoria da parcela da população de Manaus que não se deixou cegar pelo bolsonarismo, se sente sozinha e envergonhada.
Depois de tanto sofrimento, nunca imaginamos que a sensação de vergonha viria da nossa própria cidade. Não foram os traficantes de drogas nem as variantes mortais que conseguiram destruir nosso orgulho da nossa cidade. Foi o nosso próprio povo.