O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil pública pedindo à Justiça Federal a suspensão emergencial do projeto de crédito de carbono/REDD+ (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal) da Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Amazonas (Sema). A iniciativa visa implementar projetos de créditos de carbono em unidades de conservação estaduais, mas esbarra em acusações de sobreposição de territórios e falta de consulta prévia às comunidades locais, violando direitos previstos na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Falta de consulta e conflitos nas comunidades
O MPF apontou que as comunidades indígenas e tradicionais que habitam as áreas-alvo do projeto não foram consultadas adequadamente sobre sua implementação, o que resultou em atritos entre comunitários e representantes de associações vinculadas à Sema. Lideranças locais relataram ao MPF que desconheciam o projeto e que empresas já haviam sido autorizadas a atuar em seus territórios sem o consentimento dos moradores.
Por conta disso, o MPF solicitou a suspensão de todos os atos administrativos relacionados ao projeto, incluindo o edital de seleção das empresas envolvidas. Também pediu a aplicação de multa diária em caso de descumprimento, com os valores revertidos para projetos que beneficiem as comunidades afetadas.
Indenização e medidas compensatórias
Além da suspensão imediata do projeto, o MPF requer a condenação do governo do Amazonas ao pagamento de R$ 5 milhões por danos morais coletivos. A ação também solicita a realização de audiências públicas para discutir o projeto com ampla transparência e participação popular.
Críticas ao mercado de carbono
O projeto de crédito de carbono/REDD+ tem como objetivo permitir que grandes empresas compensem suas emissões de gases de efeito estufa (GEEs) ao financiar a preservação florestal. No entanto, estudos recentes indicam falhas graves na eficácia dessas iniciativas. Pesquisa publicada na revista Science em 2023 revelou que muitos créditos de carbono foram gerados com base em estimativas exageradas de benefícios ambientais. Outro estudo, divulgado em novembro de 2024 pela revista Nature, constatou que apenas 16% dos créditos realmente representam reduções nas emissões.
A Funai, por sua vez, publicou uma nota orientando povos indígenas a não participarem de projetos relacionados ao mercado de carbono, reforçando a posição de mais de 80 organizações ambientais que pedem o fim dessas compensações como solução climática.
Contexto internacional
A discussão também ganhou destaque global. Durante a Cúpula Social do G20, realizada em novembro, uma declaração assinada por representantes de diversas nações condenou o mercado de carbono como uma “falsa solução” para a crise climática, defendendo alternativas como a transição agroecológica e energética.
Judicialização após inércia do governo
Em agosto, o MPF já havia recomendado a suspensão das atividades de crédito de carbono nos territórios indígenas e tradicionais do Amazonas, incluindo o projeto da Sema. Apesar do compromisso inicial do governo em atender à recomendação, a decisão foi suspensa pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), e o governo não deu mais respostas.
Diante das contínuas denúncias de violações, o MPF decidiu judicializar a questão, buscando garantir que os direitos das comunidades tradicionais sejam respeitados e que haja maior transparência na condução dos projetos ambientais no estado.
Transparência no processo judicial
Para facilitar a compreensão da ação por parte das comunidades afetadas, o MPF elaborou um resumo detalhado em linguagem simples, seguindo orientações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A medida reforça o compromisso do órgão com a transparência e o direito à informação dos povos indígenas e tradicionais.
A decisão sobre a suspensão do projeto está agora nas mãos da Justiça Federal. Caso aceita, poderá marcar um precedente importante na proteção dos direitos dessas comunidades e na discussão sobre a eficácia e ética dos créditos de carbono como solução climática.
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