Engrenagens

MPF vê inconstitucionalidade em projetos da Aleam sobre aborto

O MPF alertou a Aleam e o Governo do Amazonas sobre projetos que violam o direito ao aborto legal. Propostas de Débora Menezes, que criminalizam ainda mais o aborto, são consideradas inconstitucionais e atentam contra os direitos das mulheres

O Ministério Público Federal (MPF) expediu recomendação formal para que a Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (Aleam) e o Governo do Estado se abstenham de adotar qualquer medida que restrinja o acesso ao aborto legal no estado. A ação ocorre em resposta direta ao avanço de projetos legislativos que buscam criminalizar ainda mais a interrupção da gravidez, inclusive nos casos já protegidos pela legislação brasileira.

A recomendação do MPF é resultado de um procedimento administrativo instaurado para acompanhar as políticas públicas de saúde sexual e reprodutiva no Amazonas. Durante a apuração, o órgão identificou projetos em tramitação na Aleam que propõem a equiparação do aborto ao crime de homicídio e a inclusão dos direitos do nascituro na Constituição estadual, como defendido pela deputada Débora Menezes (PL), conforme divulgado em matérias oficiais da própria Aleam.

“A negativa do procedimento legal e seguro, além de ferir o direito à saúde da mulher, configura preconceito em decorrência de gênero e ato de violência, especialmente contra as mais vulneráveis”, alerta o MPF no documento.

A promotoria federal reforça que legislações estaduais que tentem legislar sobre matéria penal, cível ou processual penal são inconstitucionais por invadir competência exclusiva da União. Além disso, destaca que tais iniciativas violam tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, cujo Comentário Geral nº 36/2017 afirma que os Estados devem assegurar acesso ao aborto seguro para proteger a saúde e a vida das mulheres.

Projetos de lei sob questionamento

Dois projetos propostos pela deputada estadual Débora Menezes se tornaram foco de controvérsia. O primeiro deles propõe a equiparação do aborto ao crime de homicídio, sem exceções claras aos casos já legalmente permitidos. O segundo visa incluir na Constituição do Estado do Amazonas os chamados “direitos do nascituro”, o que pode abrir brechas para interpretações que inviabilizem o aborto mesmo em casos de estupro, anencefalia fetal ou risco à vida da gestante – situações expressamente autorizadas pelo Código Penal e pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF).

Direitos sob ameaça

Para o MPF, a criminalização adicional do aborto ignora não apenas a legislação vigente, mas também os preceitos constitucionais da dignidade da pessoa humana, da laicidade do Estado e da igualdade de gênero. A recomendação enfatiza que impedir o acesso ao aborto legal agrava ainda mais a desigualdade enfrentada por mulheres em situação de vulnerabilidade econômica, social e racial.

O documento também lembra que legislações semelhantes foram consideradas inconstitucionais em outros estados, reforçando o entendimento de que iniciativas que afrontam direitos fundamentais não podem prosperar mesmo sob o manto de políticas estaduais. A Aleam e o Governo do Amazonas têm até 20 dias para informar se acatarão a recomendação e quais medidas adotarão.


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