Enquanto o Brasil se prepara para sediar a COP30 em Belém, em 2025, o Senado Federal avança para votar, até a próxima quarta-feira (21/05/2025), o Projeto de Lei nº 2.159/2021 — apelidado por ambientalistas de “PL da Devastação”. Sob relatoria do senador Confúcio Moura (MDB-RO) e com apoio explícito do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), o texto propõe uma profunda flexibilização nas regras do licenciamento ambiental brasileiro, provocando forte reação de especialistas, do Ministério Público Federal (MPF) e de organizações da sociedade civil.
Licenciamento sob ataque
A proposta em tramitação substitui o atual modelo de licenciamento, considerado uma das principais ferramentas de prevenção a danos ambientais no país, por um sistema fragilizado, com base em autodeclarações e isenções automáticas. De acordo com a análise do MPF, o PL “viola princípios constitucionais” e ameaça comprometer o controle de impactos socioambientais, especialmente em atividades de alto risco como mineração, petróleo, agronegócio e grandes obras de infraestrutura.
O texto permite, por exemplo, que atividades agropecuárias se isentem da exigência de licenciamento mediante simples formulário digital. Também transfere para estados e municípios — sem critérios mínimos nacionais — a competência para definir quais empreendimentos devem ser licenciados. Isso abre caminho para a atuação predatória em biomas sensíveis como a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal.
Poder público enfraquecido
Um dos pontos mais críticos apontados pelo MPF na Nota Técnica n.º 11/2024 é a tentativa de reduzir o papel de órgãos como o IBAMA, o ICMBio e a FUNAI, além de excluir comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais da tomada de decisão sobre empreendimentos que afetam seus territórios. O texto também enfraquece o princípio da precaução, consagrado em tratados internacionais assinados pelo Brasil, e pode inviabilizar o cumprimento de metas climáticas assumidas pelo país no Acordo de Paris.
“O projeto elimina a obrigatoriedade de avaliação de impacto ambiental em casos relevantes e permite a atuação estatal baseada exclusivamente na palavra do empreendedor”, critica o MPF. Além disso, o texto restringe a responsabilização das empresas em caso de desastres, como os de Mariana (2015) e Brumadinho (2019), ao permitir que se eximam de culpa se tiverem seguido “formalmente” as regras — ainda que os riscos fossem evidentes.
Silêncio sobre a crise climática
Outro aspecto alarmante: o projeto não menciona uma única vez a palavra “clima”. Para Gabriela Nepomuceno, especialista em políticas públicas do Greenpeace Brasil, isso é uma omissão grave. “Estamos às vésperas de sediar uma COP e o Senado empurra goela abaixo um texto que ignora completamente a crise climática”, alerta. Ela também denuncia o que considera uma “manobra antidemocrática”, já que o PL está sendo votado simultaneamente em duas comissões do Senado, acelerando sua tramitação sem o devido debate público.
Impactos irreversíveis
Mariana Mota, gerente de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, afirma que o projeto “transforma o licenciamento ambiental em um mero protocolo”. Na prática, isso pode facilitar a grilagem de terras, o avanço da mineração em áreas protegidas e a contaminação de rios e aquíferos. “Para o Congresso, a palavra de um desmatador vale mais do que um laudo técnico”, afirma.
A pressa na votação contrasta com a urgência da preservação ambiental. O PL da Devastação pode colocar o Brasil em rota de colisão com compromissos internacionais e manchar sua imagem em um momento crucial, quando o país pretende se posicionar como líder global no combate à crise climática.
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