Contexto

Bolsonaro no STF: o que está em jogo e o que vem a seguir

Bolsonaro foi denunciado por tentativa de golpe, mas ainda há disputas jurídicas sobre seu futuro. Especialistas explicam os cenários possíveis: a manutenção da inelegibilidade, uma eventual anistia e as chances de mudanças na legislação eleitoral

A Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou, nesta terça-feira (18/02/2025), uma denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras 33 pessoas por crimes como golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa. Entre os acusados estão militares de alta patente, como Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa, e Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

O documento, assinado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, detalha as ações dos envolvidos, citando planos para deslegitimar o resultado das eleições de 2022 e impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “A organização tinha por líderes o próprio presidente da República e o seu candidato a vice-presidente, o general Braga Netto. Ambos aceitaram, estimularam e realizaram atos tipificados na legislação penal como atentado contra o bem jurídico da existência e independência dos poderes e do Estado de Direito democrático”, afirmou Gonet.

A professora e mestre em Direito Penal e membro da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas (Abracrim), Jacqueline Valles, explica que, após a formalização da denúncia, inicia-se um período de defesa prévia, durante o qual Bolsonaro pode tentar persuadir os ministros do STF a não dar prosseguimento ao processo penal. “A aceitação da denúncia quer dizer que Bolsonaro é culpado? Não! Ela indica que o procurador entendeu que há indícios de que ele tenha cometido os crimes apontados pelo relatório da PF. É na fase processual que deverão ser apresentadas as provas contra ele”, analisa Jacqueline. 

Prisão só se for fundamentada na lei

Na eventualidade de uma condenação, diz Jacqueline, é importante ressaltar que Bolsonaro não deve ser preso imediatamente. “Ele tem o direito de recorrer da decisão judicial em liberdade, como está fazendo agora. O cumprimento da sentença só ocorrerá após a apreciação de todos os recursos possíveis no âmbito jurídico”, comenta a advogada.

Ela acredita, porém, que o julgamento deva ocorrer ainda em 2025. “Considerando os prazos legais e os trâmites processuais, é possível que o julgamento, na eventualidade da denúncia ser aceita, ocorra ainda em 2025”, comenta.

Uma eventual prisão só poderá ser legalmente decretada antes do trânsito em julgado caso Bolsonaro apresente alguns comportamentos ilegais durante o decorrer do processo penal. “Ele pode ser preso se obstruir a Justiça, coagir testemunhas ou se houver indicativo de que planeja fugir. Essas são as previsões legais para a prisão antes do trânsito em julgado”, completa a jurista.

O impacto jurídico da denúncia

Para o advogado eleitoral e cientista político Antônio Carlos Souza de Carvalho, a situação de Bolsonaro no Judiciário se agrava, tornando inviável qualquer tentativa de reversão de sua inelegibilidade. “A anistia é uma ficção jurídica nesse momento. O ex-presidente está falando disso porque já sabe que suas alternativas por dentro do Judiciário estão se esgotando”, disse.

Já o advogado criminalista Carlos Dantas Filho aponta que, caso Bolsonaro seja condenado pela denúncia da PGR, a inelegibilidade poderá se estender por ainda mais tempo. “Se condenado, ele teria que cumprir a pena e aguardar o transcurso de oito anos após o término da pena para voltar a ser elegível”, explicou.

O PL da inelegibilidade e a candidatura em 2026

No Congresso Nacional, há uma proposta para reduzir o período de inelegibilidade de oito para dois anos, o que poderia favorecer Bolsonaro. No entanto, Souza de Carvalho destaca que a aplicação da nova regra para condenações já transitadas em julgado seria “altamente inviável, para não dizer inconstitucional”. Dantas Filho complementa que, mesmo se aprovada, a mudança teria que respeitar o princípio da anualidade, ou seja, só valeria para eleições realizadas um ano após sua sanção.

Mesmo inelegível, Bolsonaro tem se colocado como pré-candidato para as eleições de 2026. Especialistas alertam para os riscos dessa estratégia. “Se ele pedir votos diretamente ou fizer promessas eleitorais, pode ser multado pelo TSE e ter seus perfis bloqueados”, ressalta Souza de Carvalho. Já Dantas Filho aponta que a divulgação de informações falsas sobre sua elegibilidade pode configurar crime eleitoral, com penas que incluem multa e detenção.

Julgamento no STF e os próximos passos

A denúncia da PGR será analisada pela Primeira Turma do STF, composta pelos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Luiz Fux. Caso a Corte aceite a denúncia, Bolsonaro e os demais acusados se tornarão réus e poderão enfrentar um longo processo judicial.

A defesa do ex-presidente ainda não se manifestou sobre a acusação formal. Enquanto isso, seus aliados políticos tentam articular alternativas para viabilizar um eventual retorno ao cenário eleitoral. No entanto, especialistas concordam que as perspectivas jurídicas para Bolsonaro são desafiadoras. “Sua maior chance de disputar uma eleição decorre da redução do prazo de inelegibilidade, mas a tendência é a manutenção das decisões já firmadas”, conclui Dantas Filho.


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