Dois incidentes esta semana em Manaus dão uma amostra de em que mãos está a gestão do dinheiro público na capital do Amazonas. Embora em princípio pareçam engraçados (e não deixam de ser) por serem autênticas trapalhadas, ambos os episódios também carregam uma carga dramática. E trazem grande preocupação.
O primeiro deles aconteceu neste sábado (21/10/2023), quando a Prefeitura de Manaus se envolveu em uma polêmica. Internautas flagraram a calçada da Ponta Negra com trechos pintados de vermelho no que seria parte de um “projeto” de construção de 3,6 quilômetros de uma ciclofaixa em trecho da avenida Coronel Teixeira, zona Oeste da capital.
As imagens da pintura da calçada, toda formada por pedras portuguesas trazidas no início do Século 20, geraram revolta nas redes sociais. Diante da péssima repercussão, a prefeitura divulgou nota neste domingo (22/10/2023) prometendo a remoção e limpeza de toda a extensão de pedras que recebeu a pintura e, para dar continuidade ao “projeto”, irá implantar novas pedras portuguesas na cor vermelha opaca.
E esse recuo deverá custar muito aos cofres públicos. Se esta “obra”, anunciada em maio deste ano, representava um investimento de R$ 4,4 milhões, é de se imaginar que a limpeza, as novas pedras e o remanejamento da ciclovia do local original para outro não sairá por menos do que o dobro. Possivelmente mais.
E o prejuízo aos cofres públicos poderia ser ainda pior não fosse uma autêntica trapalhada. Nesta terça-feira (17/10/2023), na Câmara Municipal de Manaus, vereadores da base aliada do prefeito David Almeida (Avante) se preparavam para votar (e aprovar, como de costume) um Projeto de Lei (PL) apresentado pelo próprio.
A proposta alterava a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do próximo ano, dando ao prefeito aumento de 20% para 30% do limite autorizado para a abertura de créditos adicionais que poderiam ser feitos pela administração municipal em 2024. Ah, ano de eleição, diga-se.
No momento da votação, os parlamentares se distraíram e ao invés de permanecerem parados – o que aprovaria o PL – levantaram a mão (acompanhando um dos vereadores). Resultado: o projeto foi vetado e o prefeito não terá esse dinheiro, que poderia ser usado em outros “projetos” como essa ciclovia.
Projeto entre aspas porque, até o momento, a única alteração no local era a tinta que será removida. E aqui vem a pior parte: na nota, a prefeitura afirmou que seguia os parâmetros definidos de forma prévia em conjunto com o Ministério Público do Estado do Amazonas (MPE-AM). E não há motivo para não acreditar nisso.
Hoje Manaus está sendo gerenciada por um executivo que não percebe o erro absurdo de alterar a configuração visual de um dos seus maiores pontos turísticos, um legislativo que não faz ideia do que está votando e um Ministério Público que não percebe o que os dois primeiros estão fazendo. E isso é extremamente grave.
Se a prefeitura não tem capacidade de consultar um arquiteto paisagista pra entender se passar uma mão de tinta em um monumento (não é a primeira vez, diga-se), como pode adaptar a cidade para que ela se torne menos quente e mais arborizada? Se o legislativo simplesmente engole qualquer coisa mandada pelo executivo e o Ministério Público a tudo assiste, pra que ambos existem?
Vimos na pandemia o que a incompetência dos gestores e a omissão dos órgãos de controle custaram em vidas de cidadãos. E mesmo que hoje a situação não seja dramática como entre 2020 e 2021, o dinheiro público é assunto muito sério.
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